(“Nêgo Sapateiro” – 25/10/1929 a 23/11/1985)
Por: Florisvaldo Ferreira dos Santos
Guilhermino Fernandes, carinhosamente conhecido como “Nêgo Sapateiro”, “Nêgo da Osana” ou “Nêgo da Badica”, deixou sua marca no município de Cansanção, no sertão da Bahia, onde se estabeleceu definitivamente em outubro de 1953. Homem simples, de origem humilde, construiu sua vida com trabalho, coragem, espírito visionário e uma forte ligação com a terra.
Origem e Infância
Nascido em 25 de outubro de 1929, era filho biológico de Rufino Fernandes e Laurinda Maria de Jesus, mas foi adotado e criado pelo casal Bernaldino e Francisca, moradores do povoado Cabeça da Vaca, em Cansanção.
Naquele tempo, era comum que famílias em dificuldades confiassem seus filhos a pessoas de confiança, garantindo-lhes dignidade e sustento. Assim, Guilhermino cresceu sob os cuidados desse casal.
Sua infância e juventude transcorreram na Fazenda Cabeça da Vaca, onde permaneceu até 1948, quando se casou e passou a morar na Fazenda Muquem, dando início à construção de sua própria família. Pouco tempo depois, em 1950, partiu para São Paulo, retornando em outubro de 1953, quando fixou residência definitiva em Cansanção e fundou sua fábrica de calçados.
A Partida para São Paulo
Como tantos sertanejos em busca de oportunidades, Guilhermino seguiu em 1950 para São Paulo. Trabalhou até 10 de outubro de 1953 no Escritório Técnico Ramos de Azevedo – Engenharia, Arquitetura e Construções Severo Villares S/A.
Entre esforço e sacrifício, como ele mesmo dizia, passava os dias “queimando lata para esquentar marmita”.
Nesse período, com disciplina e economia, conseguiu juntar algum dinheiro e aprofundar-se na profissão que já exercia desde os 12 anos: sapateiro.
O Retorno e o Espírito Empreendedor
No segundo semestre de 1953, Guilhermino voltou a Cansanção trazendo consigo experiência, coragem e o desejo de empreender. Foi então que fundou a primeira fábrica de calçados da região, a Sapataria do Nêgo.
Ali criava modelos, produzia sapatos, sandálias e outros artigos de couro, distribuindo-os para comerciantes de Cansanção e das cidades vizinhas: Itiúba, Queimadas, Monte Santo e Nordestina (à época chamada Cajueiro).
Visionário, não apenas administrava, mas acompanhava pessoalmente todas as etapas da produção, trabalhando lado a lado com seus colaboradores: José Raimundo, Gilberto, Deusdete, Amado, Elói e Nonô (Nonô do João Vermelho).
A Produção e a Continuidade
A Sapataria do Nêgo permaneceu em atividade até seu falecimento, em 23 de novembro de 1985.
Após esse período, passou a ser administrada por seu filho Onofre Fernandes, o popular “Dôdô Sapateiro”, sob a denominação Sapataria do Dôdô, que manteve o legado familiar, dedicando-se principalmente a consertos e reformas de calçados e artigos de couro.
Vida no Campo
Mesmo residindo na cidade, Guilhermino nunca se desligou do campo. Continuou cultivando feijão, milho, melancia e outras lavouras de subsistência, além de manter a tradicional casa de farinha. Como ele próprio demonstrava:
“saiu da roça, mas a roça nunca saiu dele.”
Após sua morte, a Fazenda Muquem, onde morava, foi subdividida e passou a ser administrada pelos herdeiros, recebendo nova denominação: Fazenda Santos & Fernandes.
Família
Foi casado com a senhora Osana Maria Fernandes (falecida em 08 de agosto de 2011).
O casal teve 14 filhos, entre eles:
- Valto Fernandes
- Varlene Fernandes
- Vaurilo Fernandes
- Estelita Fernandes
- Onofre Fernandes (Dôdô Sapateiro)
- Carmem Fernandes
- Raimundo Fernandes (Tumtum)
- Gisania Fernandes
- Raimunda Fernandes (Pebinha da Dona Osana)
- Lauro Fernandes (Laurinho)
Quatro filhos faleceram ainda na infância e não foram mencionados.
Em 2015, o levantamento familiar registrava: 14 filhos, 19 netos e 10 bisnetos.
Participação Comunitária e Política
Mesmo sem ocupar cargos públicos, Guilhermino foi ativo e influente na comunidade. Participou da emancipação política de Cansanção em 1956, sempre atuando nos bastidores, como conciliador respeitado por todos os articuladores da região.
Foi também nomeado Inspetor de Quarteirão, função equivalente a um delegado distrital da época, indicada pelo delegado e avalizada pelo prefeito municipal. Nessa função, mediava conflitos, conciliava desavenças e buscava soluções justas para os moradores da região da Fazenda Muquem e arredores, evitando que problemas simples precisassem chegar à Justiça.
De gênio forte, mas prestativo e justo, era reconhecido por sua disposição em ajudar sempre que possível, mas também por sua firmeza: não aceitava desaforos nem enviava recados — resolvia tudo de forma direta e transparente.
Legado
A vida de Guilhermino Fernandes foi marcada pelo trabalho, pelo pioneirismo e pelo espírito empreendedor.
Sua trajetória permanece viva não apenas entre seus descendentes, mas também na memória coletiva de Cansanção, onde seu nome se confunde com o próprio desenvolvimento econômico e social da região.
Fontes: relatos de familiares e amigos, sob supervisão de Nilton Martins de Moura.
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade
1 comentário
Florisvaldo, muito interessante
Eu nasci em 1986, um ano após o falecimento dele.
Convivi com a familia de Dona Osana e não sabia que ela teve 14 filhos.
Parabéns!