Especialistas falam sobre problemas no caso do motorista de aplicativo que morreu em acidente com carro de luxo
Um ano e quatro meses após o acidente que matou o motorista de aplicativo Ornaldo da Silva Viana, de 52 anos, a viúva e os filhos ainda revivem todos os dias o drama por causa de uma disputa judicial, tentando se livrar das cobranças pela dívida do veículo que ele usava para trabalhar.
Enquanto a questão é discutida nos tribunais, a família tenta encerrar um capítulo doloroso que mistura luto, burocracia e brigas judiciais, expondo um ponto cego comum em financiamentos de veículos no Brasil: a ausência de seguro para cobrir casos de morte do titular. Para entender melhor o que diz a lei nesses casos, o InfoMoney foi ouvir especialistas jurídicos.
Entenda o caso
Em maio de 2023, Ornaldo conduzia seu Renault Sandero branco 2018 pela Avenida Salim Farah Maluf, na Zona Leste de São Paulo, quando foi atingido por um Porsche avaliado em R$ 1,3 milhão, dirigido pelo empresário Fernando Sastre de Andrade Filho, de 24 anos. Segundo laudo pericial, o Porsche trafegava a 136 quilômetros por hora, em via cujo limite é de 50 quilômetros. Testemunhas relataram que o motorista do carro de luxo havia consumido bebida alcoólica antes da colisão.
A questão central é que Ornaldo comprara, dois anos antes da tragédia, seu Sandero por meio de um financiamento bancário de R$ 37 mil, com entrada de R$ 6,1 mil e saldo dividido em 48 parcelas de R$ 1,2 mil. Ele utilizava o carro para sustentar a família e quitar o empréstimo. Com a morte, restavam ainda 18 parcelas a vencer.
Desde então, a família relatou ao jornal O Globo que vem recebendo ligações diárias de advogados da financiadora Aymoré cobrando a dívida, mesmo após informar o falecimento. “Eles ligam para o meu celular mais de 10 vezes ao dia perguntando pelo meu marido. Isso é muito dolorido, pois já foram avisados que ele morreu de forma trágica”, disse Francilene Morais de Caldas, ao jornal. Ela afirma ter pedido que o banco recolha o carro, que permanece amassado em um estacionamento, como forma de encerrar o caso e evitar as lembranças do acidente.
O advogado da família de Ornaldo, Jair Sotero da Silva, argumenta que o banco não poderia transferir a dívida para a viúva ou os filhos, mas sim habilitar-se no inventário como credor. Ele também critica a ausência de seguro no contrato, o que considera uma falha, já que o veículo estava alienado ao banco.
No processo, a financiadora Aymoré alega que a inadimplência começou em abril de 2024 e que, segundo entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), basta o envio de notificação extrajudicial para comprovar a mora, independentemente de quem a receba. O pedido judicial inclui a apreensão do carro em até 48 horas, com autorização para arrombamento e uso de força policial, se necessário, e a transferência da propriedade ao banco caso a dívida não seja paga em cinco dias após a apreensão.
O que diz a lei
Segundo Wellington Viana Martins, advogado da Onda Segura, a quitação da dívida poderia ser resolvida de forma menos traumática caso houvesse seguro prestamista no contrato. “Se o contrato previa essa cláusula, a financiadora deveria acionar a seguradora. A família deve comunicar o óbito, abrir o sinistro e, assim, o seguro quita ou amortiza as parcelas restantes. Mas nem todos os financiamentos incluem esse seguro, pois não é obrigatório”, explica.
Já o advogado Henrique Covolam, do escritório Bruno Boris Advogados, destaca que “dívidas não são herdadas”, mas os direitos sobre bens financiados entram no inventário. “A família pode decidir se assume o financiamento para ficar com o bem ou se vende, quitando o saldo devedor. Quando há seguro prestamista, este garante a quitação ou a amortização das parcelas remanescentes, no limite contratado”, afirma.
Fonte: https://cqcs.com.br
Blog do Florisvaldo – Informação Com Imparcialidade
2 Comentários
Interessante, nesse caso o Porsche, não tinha seguro de RCF, Não foi responsabilizado por nada?
Entendo a questão do seguro prestamista, que deveria ter sido feita pela financeira, aliás era de interesse dela, bem como do seguro do carro, já que esse era a garantia. Mas a família deveria ser amparada, pelo seguro do causador do acidente, ou pelo menos responsabilizar o “empresário” pelo pagamento bem como de uma indenização pela morte do provedor, isso falando na esfera civil claro.
Fica evidente a completa falta de conhecimento — ou talvez de interesse — por parte da financeira e, possivelmente, até mesmo do proprietário do Porsche. A contratação de um seguro prestamista ou mesmo de um RCF teria evitado ou ao menos reduzido todo este impasse judicial. Infelizmente, ao final, quem arcará com as consequências será justamente a parte mais vulnerável: uma família humilde, que além de não ter seus prejuízos ressarcidos, ainda carrega a dor de uma perda irreparável.