O escritor e médico porto-alegrense Moacyr Scliar (23/03/1937-27/02/11), durante alguns anos, teve a função de produzir, no jornal ‘Folha de São Paulo’, um texto literário a partir da leitura de uma notícia escolhida dentre as da semana anterior. O que o autor fazia, então, era uma espécie de tradução de uma informação de um texto jornalístico para outro universo, no qual imprimia sua marca pessoal. Agora, tentarei fazer o trabalho inverso ao de Moacyr Scliar, ou seja, a partir do poema de Mário Quintana, escreverei uma notícia jornalística que registre, como numa página policial, os fatos relatados no poema.
Começarei com o Poema ‘Pequena Crônica Policial’ de Mário Quintana que foi escrito para uma Antologia Poética em 1999. Espero que gostem de ler, assim como eu gostei de escrever. Boa leitura e bom divertimento!
PEQUENA CRÔNICA POLICIAL
Jazia no chão, sem vida,
E estava toda pintada!
Nem a morte lhe emprestara
A sua grave beleza…
Com fria curiosidade,
Vinha gente a espiar-lhe a cara,
As fundas marcas da idade,
Das canseiras, da bebida…
Triste da mulher perdida
Que um marinheiro esfaqueara!
Vieram uns homens de branco,
Foi levada ao necrotério.
E quando abriam, na mesa,
O seu corpo sem mistério,
Que linda e alegre menina
Entrou correndo no céu?!
Lá continuou como era
Antes que o mundo lhe desse
A sua maldita sina:
Sem nada saber da vida,
De vícios ou de perigos,
Sem nada saber de nada…
Com a sua trança comprida,
Os seus olhos de menina,
Os seus sapatos antigos!
Mário Quintana
“MAIS UMA VÍTIMA DA VIOLÊNCIA” OU ‘PROSTITUTA ESFAQUEADA NO CAIS’
Por volta das 23h 30min., de ontem, em frente a um bar localizado próximo ao Cais do Porto, aconteceu à morte, por esfaqueamento, de uma mulher aparentando 40 anos, aproximadamente, e identificada apenas como Maria das Graças.
O assassino, segundo testemunhas, trata-se de um marinheiro de nome ignorado. Mas com características fáceis de ser identificadas. Esse marinheiro já freqüentava o Cais há muito tempo, e Maria das Graças o tinha com um dos inúmeros clientes. Sendo que este, depois de usar e abusar dos serviços oferecidos por Maria saiu do programa sem pagar, deixando-a, naquele momento, furiosa.
Pois, na noite de ontem, Maria havia bebido mais do que normalmente fazia. Quando o marinheiro chegou ao bar, Maria tomou coragem e foi cobrar o que era seu, por direito. Aconteceu, então, uma discussão e foi quando o tal marinheiro, sem dó e nem piedade, puxou de uma faca que trazia na cintura e cravou no peito da mulher, fazendo a pobre coitada cair no chão, morrendo em seguida.
Populares que passavam pelo local e outros que já se encontravam por ali olhavam, com certa frieza e curiosidade para a vítima que fazia no chão. O rosto, castigado pelas rugas do tempo, as quais ela tentava esconder usando uma pesada maquiagem, agora se misturava ao seu próprio sangue que ficou espirado na cara dela.
Quando os enfermeiros chegaram, foram logo levando o corpo da moça para o necrotério. Maria que nunca tivera sorte na vida, agora recebera, enfim, sua sina, desancaria em morte, onde poderia, finalmente, ter mais sorte, a sorte que não tivera enquanto viveu.
Marcelio Oliveira (Para o Portaldenoticias.net)
Jornalista
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